Comandante Geral da Polícia de Segurança Pública

Rec. nº 125/A/1993
Processo: R.1557/91
Data: 16-09-1993
Área: A5

ASSUNTO: SEGURANCA INTERNA – ABUSO DE AUTORIDADE

1. Informo V. Exª que, após exame do processo disciplinar nº …/91 instaurado ao Guarda nº …, da Esquadra de Santo António dos Cavaleiros, e com base noutros elementos de prova disponíveis, concluí não poder aceitar o despacho de arquivamento que foi lavrado no mesmo processo, pelas razões aduzidas de seguida.

2. Como resulta do auto de detenção elaborado em 23 de Abril de 1991 pelo guarda J. M. … e confirmado pelos guardas J. F. … e V. … , as lesões que apresentava o ofendido I. … teriam resultado de queda do mesmo contra uma árvore, queda essa que teria tido lugar no decorrer da fuga encetada após ter sido descoberto pelos referidos guardas na prática de actos de execução de um crime de furto de veículo automóvel

3. Porém, a Meritíssima Juíza do 1º Juízo de Instrução Criminal de Lisboa, em 23 de Abril de 1991 ao proceder ao interrogatório de I. …, verificou que o mesmo apresentava várias feridas na cabeça e [com] marcas arroxeadas nas costas em linha recta, que, com evidência, demonstram ter sido agredido com objecto contundente (vid. fls. 30 do processo disciplinar).

4. A referida Magistrada, bem como a Magistrada do Ministério Público que esteve presente no interrogatório do arguido, em 23 de Abril de 1991, quando ouvidas nesta Provedoria de Justiça, prestaram depoimento claro e convicto de que o I. … apresentava sinais inequívocos de ter sido agredido a”cassetête”na cabeça e nas costas, conforme fotocópia anexa do respectivo depoimento. (Anexo I no processo da presente Recomendação).

5. A agressão do ofendido I. … foi testemunhada pelo seu co-arguido M. … que, ao ser ouvido no Tribunal Judicial de Loures, afirmou, ainda, que o Isidoro Andrade foi obrigado a permanecer cerca de duas horas ajoelhado em cima do cabo de uma vassoura. (Anexo II no processo da presente Recomendação).

6. A versão constante do auto de detenção não merece a menor credibilidade, já que a mesma não explica os vários golpes que o ofendido apresentava na cabeça, além de não dar qualquer explicação para as lesões existentes nas costas do mesmo ofendido.

7. Considero, assim, existirem indícios mais que bastantes de que os guardas J. M. …, J. F. … e V. …, com os sinais dos autos, e todos da Esquadra da Polícia de Segurança Pública, no dia 23 de Abril de 1991, entre as 01 e às 02 horas, no Largo El-Rei D. Duarte e na Esquadra de Santo António dos Cavaleiros, Concelho de Loures, e em coautoria material agrediram voluntária e corporalmente a “cassetête” o ofendido I. …, causando-lhe uma ferida incisa no couro cabeludo e lesões nas costas, além de o terem obrigado a ajoelhar durante duas horas sobre o cabo de uma vassoura.

8. Com tal comportamento violaram dolosamente o dever de correcção prevista no artigo 13º, nº 2, alínea a) e d) do Regulamento Disciplinar aprovado pela Lei 7/90, de 20 de Fevereiro.

9. Nestes termos, e porque considero existirem indícios de prática de infracção disciplinar pelos três Guardas em causa, tenho por bem formular RECOMENDAÇÃO a V. Exª

em ordem a que o processo disciplinar 153/91 seja reformulado por forma a que contra os referidos guardas seja deduzida acusação e a final aplicada sanção punitiva adequada aos factos praticados.

Agradeço que me seja comunicado o teor do despacho que recair sobre a RECOMENDAÇÃO ora formulada.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel