ANOTAÇÃO


Processo: R-1304/06 (A2)


Assunto: Fundos europeus e nacionais. Agricultura. Medidas agro-ambientais. Indeferimento das candidaturas de 2005.


Objecto: Legalidade do indeferimento das candidaturas apresentadas para o ano de 2005 ao abrigo das medidas agro-ambientais.


Decisão: A instrução do processo promovida junto do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas permitiu esclarecer que a decisão de indeferimento das candidaturas respeitou a legislação nacional e comunitária.




Síntese:



1. Vieram os agricultores, na qualidade de candidatos às medidas agro-ambientais instituídas no âmbito do Plano de Desenvolvimento Rural (RURIS) pela Portaria n.º 1212/2003, de 16 de Outubro, contestar perante o Provedor de Justiça o indeferimento das candidaturas que apresentaram para o ano de 2005.



2. Alegaram os agricultores terem sido violadas as suas legítimas expectativas de virem a receber as ajudas, à semelhança do que sucedera nos anos anteriores, considerando que o seu pagamento estava apenas dependente de um mero controlo administrativo por parte do IFADAP/INGA, enquanto entidade receptora das candidaturas.



3. As diligências promovidas pelo Provedor de Justiça junto do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas procuraram esclarecer:




– O procedimento inerente à comunicação do indeferimento das candidaturas;
– O momento em que essa comunicação foi feita;
– A opção pela não hierarquização das candidaturas perante a escassez de dotação orçamental.



4. Após ponderação da resposta prestada pelo Gabinete de Sua Excelência o Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas em conjunto com a análise da legislação nacional e comunitária aplicável, foi possível alcançar as conclusões que se seguem :



Novas candidaturas de 2005




a. As ajudas cujo pagamento foi reclamado pelos agricultores e rejeitado pelo Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas dizem respeito a novas candidaturas a iniciar a partir do ano de 2005 – sobre as quais não chegou a recair qualquer acto de aprovação – e não a contratos que estivessem já em vigor nessa data, cujos compromissos foram reconhecidos e aceites por esse Ministério;


b. A Portaria n.º 1212/2003, de 16 de Outubro, fez depender o pagamento [anual] das candidaturas da sua confirmação, também anual, destinada a verificar se os beneficiários continuavam a cumprir os compromissos a que se vincularam;


c. Não deve, porém, confundir-se essa confirmação anual com a apresentação de novas candidaturas, carecidas, naturalmente, de apreciação, e sobre as quais poderia recair quer uma decisão de aprovação, quer de indeferimento;


d. À semelhança do que sucede em todos os programas de apoio financeiro, os candidatos não gozam de um direito automático à aprovação das respectivas candidaturas, mas tão-só, de um direito à sua apreciação em tempo útil, pelo que, quando decidem iniciar a execução dos investimentos antes de serem notificados da decisão final, fazem-no por sua conta e risco, presumindo um deferimento tácito que a lei não autoriza;


e. A eventual aprovação das candidaturas em causa implicaria a assunção de novos compromissos com uma duração de cinco anos, capazes de comprometer a negociação do próximo Quadro Comunitário de Apoio, a vigorar entre 2007 e 2013, no que ao apoio à agricultura e ao desenvolvimento rural diz respeito.


Descontratualização das ajudas a partir de 2003




a. Desde a campanha de 2003 que o pagamento da ajuda não exige a celebração prévia de um contrato formal ou escrito, pelo que teria que se aferir o momento e a forma como um agricultor toma conhecimento de que a sua candidatura foi aprovada e o IFADAP/INGA fica vinculado perante o agricultor;


b. Por razões óbvias atinentes à segurança jurídica, será de rejeitar a tese de que a mera apresentação da candidatura ou, sequer, a sua confirmação anual poderiam gerar um direito à respectiva aprovação e, consequentemente, ao recebimento da ajuda, até porque a vinculação da entidade gestora só pode verificar-se desde o momento em que pratica um qualquer acto do qual se possa inferir ter considerado a candidatura elegível e correcta e suficientemente instruída;


c. Tal “acto concludente da aprovação da candidatura” não pode também corresponder à realização de controlos de campo, uma vez que os mesmos incidem apenas sobre uma amostra de candidatos;


d. Será de aceitar, porém, que, face ao disposto no n.º 4 do art.º 87.º da Portaria n.º 1212/2003, de 16 de Outubro, a partir da campanha de 2003, não só os candidatos deixaram de celebrar contratos com o IFADAP/INGA, como as candidaturas passaram a ser aprovadas ou recusadas em função das disponibilidades orçamentais;


e. À luz daquele diploma, também, as decisões de aprovação das candidaturas às medidas agro-ambientais deixaram de ser objecto de notificação expressa aos beneficiários, pelo que o acto de aprovação das mesmas só poderá consubstanciar-se no acto de pagamento, que está dependente, por lei, da existência de dotação orçamental;


f. Pelo que, a partir da campanha de 2003, e na falta de um contrato escrito, só com o pagamento se pode dizer que havia uma manifestação de vontade da parte do IFADAP/INGA em aceitar a candidatura e reconhecê-la como elegível.


Inobservância do prazo legal de decisão: indeferimento tácito das candidaturas




a. Considerando que só em Março de 2006 os agricultores terão sido notificados do indeferimento das candidaturas que haviam apresentado entre Fevereiro e Maio de 2005, não pode deixar de se admitir que não foi respeitado o prazo máximo de decisão definido de acordo com as regras do procedimento administrativo;


b. Partindo do pressuposto de que a regra no Direito Administrativo é a do acto tácito negativo, o atraso na comunicação do indeferimento das candidaturas que se verificou em relação ao ano de 2005 só poderia ter como consequência o respectivo indeferimento tácito (cfr. art.º 109.º do Código do Procedimento Administrativo);


c. Assim, em termos jurídicos, e ainda que se reconheça que os atrasos no processamento das ajudas constituíam prática habitual, não seria legítimo aos agricultores presumir a aprovação dos respectivos pedidos de ajuda;


d. Pelo contrário, poderiam ter reagido contra esse indeferimento através dos meios legais ao seu dispor.



Hierarquização das candidaturas : Portaria n.º 1212/2003, de 16 de Outubro e Reg. (CE) n.º 1360/2005, da Comissão, de 18 de Agosto




a. Para além de ter colocado a aprovação das candidaturas na dependência de dotação orçamental, valorizando o pagamento (anual) das ajudas como acto concludente da sua aprovação, a Portaria n.º 1212/2003, de 16 de Outubro estabeleceu também critérios de hierarquização;


b. Teria então que se analisar se, à luz de tais critérios, fixados no art.º 87.º daquela Portaria, seriam ou não tuteláveis as expectativas dos candidatos de virem a ser processadas as ajudas de acordo com essa graduação, perante a constatação da escassez dos fundos;


c. Só que, posteriormente, o Regulamento (CE) n.º 1360/2005, da Comissão, de 18 de Agosto veio permitir aos Estados-Membros optar pela prorrogação, por um ano, dos compromissos agro-ambientais já assumidos e que terminariam antes do fim do período de programação em curso, em vez de subscreverem com os agricultores novos contratos de cinco anos cujo cumprimento poderia comprometer o próximo período de programação (2007-2013), para o qual estão previstos novos critérios e valores financeiros em termos de apoio ao desenvolvimento rural;


d. De acordo com o entendimento transmitido à Provedoria de Justiça pelo Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, as Portarias n.º 52/2006, de 12 de Janeiro e 143/2006, de 20 de Fevereiro, destinaram-se, precisamente, a aplicar a opção consentida por essa legislação comunitária, justificada com o facto de a execução financeira das medidas agro-ambientais estar já próxima dos limites orçamentais estabelecidos;


e. O Regulamento (CE) n.º 1360/2005, de 18 de Agosto, permitiu, de forma expressa, aos Estados-Membros preterirem a celebração de novos contratos (ou a vinculação a novos compromissos) em favor da continuidade dos compromissos já assumidos;


f. Ao conceder aos Estados-Membros a possibilidade de escolherem entre a vinculação a novos compromissos com duração de cinco anos nos termos das normas aplicáveis ao período de programação em curso e a prorrogação dos contratos agro-ambientais já em vigor, aquele Regulamento afastou qualquer possibilidade de invocar a obrigatoriedade de pagamento das ajudas a novas candidaturas seguindo quaisquer regras de hierarquização ou de graduação.


g. Isto é, esse Regulamento permitiu que os Estados-Membros canalizassem os fundos orçamentais disponíveis para um outro fim distinto do pagamento das candidaturas de 2005, designadamente, para assegurar a continuidade da vigência de outros pedidos já aprovados em anos anteriores.


h. A opção pela prorrogação dos contratos agro-ambientais vigentes afastou a obrigatoriedade de pagamento das ajudas a novas candidaturas seguindo regras de hierarquização ou de graduação, pois a sua aplicação está dependente, precisamente, da contratação de novas ajudas, isto é, da vinculação a novos compromissos quinquenais.


5. Concluindo que não cabe ao Provedor de Justiça censurar a opção de carácter político que o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas fez no âmbito da intervenção das medidas agro-ambientais, foi arquivado o processo, com base no entendimento de que a posição assumida se encontra suportada numa interpretação razoável das normas nacionais e comunitárias aplicáveis.



6. Contudo, do estudo da questão exposta resultou também a convicção de que as expectativas dos agricultores que terão sido frustradas com a rejeição das novas candidaturas resultaram da falta de rigor e de clareza do regime jurídico das medidas agro-ambientais então em vigor, que se veio a revelar excessivamente flexível e de um quase-automatismo juridicamente condenável.



7. Nestes termos, a comunicação do arquivamento do processo a Sua Excelência o Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas foi acompanhada de uma chamada de atenção destinada a assegurar que o novo regime jurídico das medidas agro-ambientais contemplará regras que confiram as necessárias certeza e segurança jurídica à contratação e atribuição deste tipo de ajudas.



8. Em resposta, foi este órgão do Estado informado de que a referida chamada de atenção havia sido devidamente ponderada e que as sugestões formuladas seriam “integralmente absorvidas na revisão do regime jurídico de aplicação das medidas agro-ambientais (…) que apontará precisamente no sentido do restabelecimento dos contratos escritos para o efeito da atribuição de ajudas, por forma a garantir aos beneficiários uma maior segurança jurídica…”