Ex.mo Senhor                                                                          
Presidente do Instituto
dos Registos e do Notariado, IP
Av. D. João II, nº 1.8.01D – Edifício H
Campus da Justiça – Apartado 8295
1803-001 LISBOA                                                              

 

Vª Ref.ª
Of. 758/DP/11
Proc. RP/Proj.

Vª Comunicação
21.06.2011 Nossa Ref.ª
Proc. R-0203/11 (A1)

Assunto: propriedade horizontal – limitações ao exercício dos direitos – Conservatória do Registo Predial – Av. Da Liberdade, Bloco 4, Portalegre.

 

RECOMENDAÇÃO Nº 6/A/2012

Formulada nos termos do artigo 20º, nº 1, alínea a), do Estatuto do Provedor de Justiça (aprovado pela Lei nº 9/91 de 9 de Abril).

I
DOS FACTOS

1. A minha intervenção foi solicitada junto do Instituto superiormente dirigido por V. Ex.a. opondo-se o queixoso à instalação sobre a fachada de um imóvel de um aviso luminoso de identificação dos serviços públicos da Conservatória do Registo Predial de Portalegre, instalada na morada acima indicada.

2. O edifício encontra-se sujeito ao regime da propriedade horizontal. Por conseguinte, o património do Estado limita-se à fração autónoma utilizada pela Conservatória e à quota ideal nas partes comuns.

3. A queixa apresentada opõe considerações de ordem estética as quais não me compete apreciar.

4. Afirma-se porém ter sido instalado à revelia dos demais condóminos, os quais, para o efeito não foram chamados a prestar o consentimento, nos termos previstos pelo artigo 1422º, nº 3, do Código Civil (ex vi do nº 2, alínea a), do mesmo artigo 1422º).

5. Analisados os termos da queixa, foi solicitada a pronúncia do IRN, IP, de modo a que nos habilitassem com as razões por que se abstivera de obter a prévia autorização da assembleia de condóminos, não obstante a intervenção que pretendia levar a efeito na fachada do edifício, alterar a sua linha arquitetónica.

6. Viria o IRN, IP, contrapor com o facto de se tratar de painel meramente informativo, de comprovada importância para a identificação dos serviços públicos e de impacto urbanístico que dispensava o controlo municipal.

II
DOS FUNDAMENTOS

7. Comecemos pelo último argumento deduzido: a anuência dos demais condóminos não se justificaria por motivo da escassa relevância urbanística.

8. A escassa relevância urbanística é um conceito que serve de pressuposto à isenção de licença ou de comunicação prévia das operações urbanísticas, de acordo com o disposto no artigo 6.º, n.º 1, alínea c), do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação.

9. Mas se a relevância urbanística é escassa, isso não quer dizer que a relevância civil se mostre diminuta.

10. O legislador entendeu que certas operações urbanísticas, porque de reduzido alcance na salubridade, estética e segurança das edificações, só seriam fiscalizadas pelas autoridades municipais no decurso ou no termo da sua execução (artigo 93.º do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação).

11. Encontramo-nos no plano do direito público, da ordem pública urbanística.

12. De resto, o Estado e algumas outras pessoas coletivas públicas encontram-se isentos de licenciamento municipal em muitas operações urbanísticas que levam a cabo (artigo 7.º), o que não significa porém poderem eximir-se ao cumprimento das «normas legais e regulamentares que lhes forem aplicáveis, designadamente as constantes de instrumento de gestão territorial, do regime jurídico de proteção do património cultural, do regime jurídico aplicável à gestão de resíduos de construção e demolição, e as normas técnicas de construção» (artigo 7.º, n.º 6).

13. No plano das relações jurídicas reais privadas, nomeadamente as emergentes de propriedade horizontal, o Estado e o Instituto superiormente representado por V. Ex.a. encontram-se exatamente na posição de outro qualquer condómino, vinculados ao título constitutivo e às normas contidas nos artigos 1414.º e seguintes do Código Civil.

14. As inovações – independentemente do seu alcance – dependem sempre «da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio» (artigo 1425.º, n.º 1).

15. Não vale a pena, por conseguinte, controverter a instalação dos painéis como obras ou não, se estão ou não incorporados na fachada, pois sempre são de considerar inovações na linha arquitetónica.

16. Opõe-se, por outro lado, que os painéis não têm fins de publicidade comercial, antes se limitam a prestar aos utentes da Conservatória informação acerca da sua localização.

17. A diferença entre publicidade comercial e institucional, entre propaganda e simples informação pode ter relevância na aplicação de determinados regimes jurídicos, mas não certamente no direito civil.

18. Se os proprietários de um edifício tivessem de suportar contra a sua vontade uma inovação na fachada contra a sua vontade ou sem exprimirem sequer a sua vontade, estaríamos perante uma servidão administrativa, a constituir de acordo com o Decreto-lei n.º 181/70, de 28 de abril.

19. Ora, justamente no preâmbulo deste diploma explica-se: «Contrariamente ao que se dá no domínio do direito civil, as servidões administrativas são sempre legais, isto é, resultam sempre da lei».

20. Nenhuma lei criou servidões administrativas para afixar informação institucional nas fachadas de edificações particulares.

21. Nestes termos, e apresentando-se o IRN, IP como condómino destituído de qualquer prerrogativa ou vantagem relativamente aos demais, não se descortina apoio alguma para justificar a afixação ou instalação unilateral dos painéis que identificam a Conservatória do Registo Predial de Portalegre nas partes comuns.

22. Sem obter a necessária autorização civil, o IRN, IP terá de limitar-se a um sinal identificativo junto aos acessos em termos que não possam representar uma inovação e porventura instalar na via pública – com prévia informação às autoridades municipais – de um sinal distintivo da localização dos serviços públicos de Registo Predial.

III
CONCLUSÕES

São estas motivações, SENHOR PRESIDENTE DO INSTITUTO DOS REGISTO E DO NOTARIADO IP., que me aconselham dever Recomendar a V. Exa, ao abrigo do disposto no artigo 20º, nº 1, alínea a), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril, que:

Sejam adotadas providências para obter o consentimento da maioria dos condóminos, conquanto representando dois terços do valor total do prédio, a fim de conservar os painéis contra cuja instalação unilateral me foi apresentada queixa.

Por outro lado, considerando as incumbências de aperfeiçoamento da atividade administrativa que me assistem (artigo 21.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 9/91, de 9 de abril), permito-me sugerir

Sejam todas as demais conservatórias instaladas em edifícios sob propriedade horizontal, orientadas para a necessidade do cumprimento das normas que regulamentam as relações entre condóminos, sem qualquer prerrogativa devida à natureza pública do serviço prestado.

Nos termos do disposto no artigo 38º, nº 2, da Lei nº 9/91, de 9 de Abril, solicito a V. Exa. que me comunique a posição assumida em face da presente Recomendação.

Com os melhores cumprimentos,

O PROVEDOR DE JUSTIÇA,

(Alfredo José de Sousa)