Provedor de Justiça alerta para necessidade de acautelar os direitos dos contribuintes indevidamente envolvidos na acção de cobrança de dívidas à Segurança Social

O Provedor de Justiça alertou o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social (MTSS) para a necessidade de serem acauteladas as garantias e os legítimos direitos de todos os contribuintes que foram, indevidamente, envolvidos na acção nacional de cobrança de dívidas à Segurança Social, encetada em Fevereiro último pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, no âmbito do Plano Nacional de Prevenção e Combate à Fraude e Evasão Contributivas e Prestacionais. A chamada de atenção surge na sequência de várias reclamações que deram entrada na Provedoria de Justiça sobre a forma como decorreu a operação de notificação de 160 mil empresas, alegadamente devedoras. O Provedor de Justiça defende que o MTSS deve “concluir a análise das reclamações apresentadas com toda a urgência, por forma a repor a verdade dos factos e desobrigar todos aqueles que, involuntária e injustamente, foram objecto de execuções fiscais”.

No entender de Nascimento Rodrigues, “suscita natural preocupação a forma algo precipitada como terá sido conduzido este processo de cobrança de alegadas dívidas à Segurança Social”. Muitas entidades contribuintes contestam tais dívidas com diversos fundamentos, nomeadamente a falta de notificação para pagamento voluntário das dívidas comunicadas; a prescrição das dívidas em execução; o pagamento já efectuado (ou em curso) das dívidas em execução; a inexistência das dívidas reclamadas e a exiguidade dos montantes devidos face à gravidade do meio de cobrança utilizado (numa das situações reclamadas, a dívida corresponde à soma de 10 fracções de 0,01 cêntimos resultantes da conversão de escudos para euros).

Foram igualmente recebidas muitas reclamações da parte de técnicos oficiais de contas (TOC’s), cuja honorabilidade e reputação profissionais se consideram gravemente postas em causa, quando as empresas que representam e acompanham, na organização da respectiva contabilidade, se viram confrontadas com as referidas notificações. Essas citações dos executados suscitaram nos mesmos a convicção justificada de que aqueles profissionais não haviam cumprido os deveres para os quais haviam sido mandatados, através do pretenso desvio das verbas destinadas a ser entregues à Segurança Social.

Atendendo às elevadas taxas de fraude e evasão ao Fisco e à Segurança Social registadas em Portugal, o Provedor de Justiça sublinha que são de louvar as medidas e os procedimentos que os Governos adoptem no combate à evasão e à fraude no cumprimento das obrigações contributivas (contribuintes) e no acesso às prestações sociais (beneficiários), “desde que salvaguardando, no estrito cumprimento da lei, todas as garantias dos contribuintes e beneficiários”. Entende ainda que, em várias situações, tais garantias não estão a ser respeitadas com a presente alteração de procedimentos e métodos na cobrança de dívidas, que conduziu a que, em muitos casos, se penalizasse o contribuinte cumpridor, onerando-o com a obrigação de vir provar, em sede já de processo executivo, que pagou o que devia. “No âmbito da recuperação de dívidas, a Administração da Segurança Social passou de uma situação de inércia para uma actuação radical, intransigente e pouco rigorosa, sem grandes preocupações quanto aos direitos e garantias dos cidadãos visados”, verifica Nascimento Rodrigues.

Em nota à imprensa datada de 6.02.2006, o MTSS reconhecera expressamente que “numa operação desta complexidade, e face à precariedade da situação anterior assente numa base de dados deficiente, a possibilidade de existirem erros é real, pelo que a Segurança Social lamenta eventuais transtornos causados aos contribuintes.” O MTSS anunciou então que “atendendo à dimensão desta operação que de imediato se reflecte no fluxo de contribuintes aos postos de atendimento da Segurança Social, foram criados mecanismos especiais de apoio ao contribuinte com o objectivo de facilitar a regularização de situações em falta, ou, destinados a fazer face a reclamações, mesmo que não justificadas”.

O Provedor de Justiça considera que “uma boa parte dos erros poderia ter sido evitada se, previamente ao envio indiscriminado das notificações, tivesse existido uma adequada e exigível articulação do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social com o Instituto de Segurança Social (concretamente, com os seus Centros Distritais de Segurança Social e os seus Serviços de Fiscalização), proporcionando uma auditoria preliminar aos saldos das contas correntes dos contribuintes dados como faltosos”. Outra das medidas que teria, eventualmente, contribuído para restringir o universo dos contribuintes ilegitimamente executados, passaria pelo envio de notificações para o pagamento voluntário contendo a cominação da instauração do processo executivo, se num prazo tido por razoável não sobreviesse uma prova do pagamento das dívidas, ou uma prova da sua não exigibilidade. Não tendo qualquer destes procedimentos sido adoptado, criou-se um processo de cobrança que, para além de não respeitar as garantias dos visados, não alcançou, até ver, os seus fins, apenas tendo contribuído para o entupimento das Secções de Processo e dos Centros Distritais de Segurança Social com reclamações e deslocações dos visados.

Os contactos informais efectuados pela Provedoria de Justiça para algumas Áreas de Contribuintes dos Centros Distritais de Segurança Social em causa nas queixas confirmam que se registou um volume elevado de contestações às dívidas comunicadas, não sendo possível antever quando estará concluída a análise de todas as reclamações entradas. Dadas estas dificuldades, Nascimento Rodrigues sugere ao Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social que “dote os Serviços das Secções de Processo e dos Centros Distritais de Segurança Social competentes com mais pessoal e mais meios”. O Provedor de Justiça defende também a concessão de uma tutela especial para os TOC’s que representam muitas das empresas citadas e que “verão a sua credibilidade abalada, pelo tempo que demorar o esclarecimento dos factos”.

-0001-11-30