Provedor de Justiça requer ao TC fiscalização abstracta e sucessiva da constitucionalidade do decreto regulamentar que define regime de selecção de pessoal para a Polícia Marítima

O Provedor de Justiça requereu ao Tribunal Constitucional (TC) que aprecie e declare, com força obrigatória e geral, a inconstitucionalidade das normas constantes do artigo 11.º, alíneas f) e l), do Decreto Regulamentar n.º 53/97, de 9 de Dezembro, que define o regime do recrutamento e selecção de pessoal para admissão dos candidatos à Polícia Marítima. As normas em causa estabelecem um conjunto de requisitos cumulativos de admissão a concurso para candidatos a agentes estagiários. Entre esses requisitos contam-se o de “não ter sido condenado por qualquer crime doloso” e o de “não ter averbado quaisquer punições durante o cumprimento do serviço militar”. Preceitos que, no entendimento de Nascimento Rodrigues, violam a norma da Constituição que determina que “nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos” (art.º 30.º, n.º 4).

Os requisitos contestados acarretam a impossibilidade de admissão a concurso e assim o eventual acesso a uma determinada profissão. Não se está perante uma apreciação e valoração autónoma do comportamento anterior do candidato, mas antes perante uma consequência automática de sanções anteriormente aplicadas. Essa consequência está desligada de qualquer adequação e proporcionalidade em relação ao caso concreto, colidindo com o já citado art.º 30.º, n.º 4 da Constituição.

A vasta jurisprudência do TC sobre esta matéria vai no sentido de que os efeitos das penas se traduzem materialmente numa verdadeira pena, sujeita às regras próprias do Estado de direito democrático, designadamente as da reserva judicial, do princípio da culpa e da proporcionalidade da pena. A título de exemplo, o Acórdão n.º 562/03 declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral, de uma norma do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana (GNR), conjugada com uma outra norma do Regulamento de Disciplina da GNR, que estabeleciam como condição especial para a promoção ao posto de cabo, por diuturnidade, a de não ter o candidato sido punido na Guarda com o somatório de penas superior a vinte dias de suspensão ou equivalente. No referido acórdão, pode ler-se que “introduzido na revisão constitucional de 1982, o n.º 4 do artigo 30.º da Constituição visa impedir que da aplicação de uma pena resulte automaticamente, de forma meramente mecânica, uma outra pena, sem que, para tal, haja uma ponderada intervenção judicial”. Ainda de acordo com a jurisprudência do TC, este artigo da Lei Fundamental é aplicável a sanções penais e a sanções de tipo disciplinar.

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