Provedor de Justiça vê reconhecida pelo Governo a necessidade de encontrar um tratamento justo para os proprietários de solos urbanos atingidos por estudos prévios para futuras estradas nacionais

 
O Provedor de Justiça vê reconhecida pelo Governo a necessidade de pôr termo à abusiva reserva de terrenos privados para futuras estradas nacionais, apenas previstas, mas sem traçado definido nem estimativa de início dos trabalhos.
O Secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações dispôs-se a introduzir um prazo de caducidade aos estudos prévios, de modo a libertar os imóveis reservados em corredores que podem atingir 400 metros indefinidamente se não começar a obra pública ou nem sequer o procedimento de aquisição dos terrenos.
O Provedor de Justiça tem chamado a atenção para o sacrifício redobrado que é imposto a estes proprietários. São atingidos por efeitos semelhantes aos de uma expropriação sem receberem a justa indemnização a que teriam direito. Logo que publicado o estudo prévio, sem haver anteprojeto da estrada, o proprietário nada pode construir, mesmo que o plano diretor municipal considere os solos como aptos para construção. É o que ocorre designadamente em Gualtar, Braga, com a variante à EN 103 e que motivou a queixa mais recente sobre este assunto (2012). Os proprietários estão vários anos sem serem indemnizados e nem tão-pouco têm a garantia de um dia virem a sê-lo.
Este órgão do Estado já indicou casos semelhantes[1] e começou por tentar persuadir a EP – Estradas de Portugal a aplicar, ao menos, duas garantias que remontavam a uma norma nunca revogada do Estatuto das Estradas de Nacionais de 1949[2]: o direito a obter uma indemnização ao fim de três anos se a expropriação por utilidade pública não fosse iniciada e o direito a obter a expropriação com a justa indemnização devida, ao termo de cinco anos. 
Perante a intransigência da EP – Estradas de Portugal, que considerava caducada essa norma, o Provedor de Justiça chegou a recomendar, em 2008, uma alteração legislativa das servidões administrativas[3], em geral, que restituísse um mínimo de garantias aos proprietários lesados. A especificidade do caso das estradas nacionais afastava a aplicação de garantias gerais consagradas em leis sobre ordenamento do território ou responsabilidade civil do Estado. Apesar da anuência genérica do Governo, essa iniciativa ver-se-ia confrontada com o desfasamento crescente entre o Plano Rodoviário Nacional e as condições das finanças públicas.
Decorridos seis anos, o Provedor de Justiça confia que seja levada a bom porto esta iniciativa e congratula-se com o tratamento concedido pelo Secretário de Estado ao caso concreto: compromisso de analisar exclusão do terreno afetado em Gualtar, provavelmente no âmbito da revisão do Plano Diretor Municipal de Braga.
 
  


[1] 1995 – Destinação de certa parcela, por força de plano diretor municipal, à instalação de equipamentos e outros usos de interesse público, resultava na privação de aproveitamento do imóvel desde então; 1996 – Classificação de um prédio, por plano de ordenamento de área protegida, como corredor ecológico, inviabilizando todo e qualquer aproveitamento do solo (apesar de não se avançarem fundamentos inteligíveis para a definição desse corredor, nem se prever qualquer compensação em face da desigualdade de tratamento entre parcelas limítrofes com igual aptidão); 1997 – Inviabilidade de aproveitamento urbanístico de um terreno abrangido, durante cinco anos, por faixa de reserva para construção de autoestrada, após o que foi declarada a utilidade pública para expropriação apenas de uma parte do imóvel atingido por aquela servidão; 1999 – Reserva de parcela urbana, durante mais de 10 anos, para construção de uma via de comunicação, sem que ao proprietário fossem, ao menos prestadas as explicações que pedira; 2002 – Lucros cessantes imputados a estudo prévio e que levaram os proprietários a perderem comprador com quem tinham celebrado contrato-promessa; 2004 – Indeferimento de licença de construção de moradia porque a parcela de terreno se encontrava classificada pelo plano diretor municipal, há quase 10 anos, como área de equipamento estruturante-religioso; 2005 – Impedimento à edificação imposto durante mais de 10 anos sobre uma parcela de terreno sujeita a atravessamento por uma futura variante de estrada nacional; 2005 – Prejuízo imputado à omissão do Programa Polis em executar um plano de pormenor, de 2003, sujeito ao sistema de imposição administrativa e que, por natureza, impedia os particulares de promoverem a sua execução autónoma; 2007 – Alegada inconstitucionalidade das medidas preventivas instituídas, desde 1997, no local onde se previa a construção do aeroporto internacional da Ota; 2008 – Depois de 17 anos a aguardar a aquisição municipal de um imóvel adstrito a equipamento coletivo, o proprietário viu-se confrontado, na revisão do plano diretor municipal, com a sua reclassificação como solo rural, na qualidade de solo florestal.
[2] Lei n.º 2037, de 19 de agosto de 1949.
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