Situação no EP de Caxias.

São do conhecimento público as recentes manifestações de protesto no EP de Caxias. O Provedor de Justiça determinou, em consequência, uma deslocação de colaboradores seus ao referido estabelecimento para apuramento das causas do sucedido e do modo de superar a situação criada.


Na base do ocorrido está a entrada em vigor de novo Regulamento Interno, designadamente na parte em que limita a circulação de dinheiro no estabelecimento e na restrição que passa a impor à recepção de refeições confeccionadas no exterior.


Como pano de fundo desta questão, ressaltam os problemas já conhecidos do sistema prisional, em particular do EP de Caxias, nomeadamente a sobrelotação, a ausência de separação entre categorias de reclusos (v. g., entre presos preventivos e condenados), e a deficiência da estrutura do estabelecimento, construído de raiz como forte militar e não como prisão.


No que ao Regulamento Interno diz respeito, considerou o Provedor de Justiça não ser de censurar o conteúdo das normas nele estabelecidas. Assim, no que à circulação de dinheiro diz respeito, sendo conveniente a limitação da mesma, por óbvias razões de segurança e disciplina, considerou-se que a disponibilização de dez mil escudos por quinzena era suficiente para as necessidades previsíveis, tendo em conta que não existe limite de gasto em produtos encomendados em sistema de cantina semanal. A este propósito, todavia, recordou-se a necessidade de implementação de um sistema de porta-moedas electrónico no cartão de utente da DGSP, assim eliminando trabalho burocrático e a necessidade de restrições deste tipo.


Quanto ao fornecimento de alimentos confeccionados no exterior, o Regulamento Interno apenas reproduz a lei em vigor, proibindo-a, como regra, a condenados e permitindo-a a reclusos em prisão preventiva. Não sendo muito claro o alcance de algumas limitações a este fornecimento aos presos preventivos, foi possível, nos contactos estabelecidos, detectar a existência de equívocos gerados na interpretação das normas em questão.


Considerou, assim, o Provedor de Justiça que terão ocorrido erros e omissões na forma como o Regulamento foi transmitido aos reclusos. Por um lado, o texto foi divulgado cerca de uma semana antes da sua entrada em vigor, quando seria necessário ter em consideração a baixa escolaridade da esmagadora maioria dos reclusos e consequente probabilidade de uma deficiente interpretação e interiorização das novas normas regulamentares. Por outro lado, foi o mesmo Regulamento transmitido numa versão incorrecta, omitindo de todo o regime permissivo em relação aos reclusos preventivos, o que gerou nestes reacção natural, face ao regime legal de que gozam.


A antiguidade do diploma que rege a vida prisional (decreto–lei 265/79) e a necessidade de adaptação de todo o modelo a novas realidades levou o Provedor de Justiça a, mais uma vez, sublinhar a urgência da conclusão do procedimento legislativo conducente à aprovação de nova lei de execução de penas privativas da liberdade.


A falta de separação dos reclusos (entre preventivos e condenados), conjugada com a sobrelotação, torna inevitável a incompreensão da distinção de regimes pela população prisional, pelo que se insistiu na necessidade da rápida abertura do EP da Carregueira, instrumento essencial para descompressão da situação vivida, não só no EP de Caxias como provavelmente também no EP de Lisboa.


Em síntese foi proposto, quanto à situação concreta:


a) que seja devidamente esclarecido o real conteúdo do novo Regulamento Interno, em termos de promoção da aceitabilidade das suas regras;


b) que seja concretizada a análise e implementação do uso do cartão de utente como meio de pagamento dentro dos estabelecimentos prisionais;


c) que seja intentado, a curto prazo, um esforço de reordenamento organizativo tendente à minimização dos efeitos sofridos em relação ao sistema de banho não diário, mormente nos casos mais significativos de actividade física, profissional ou situação de doença;


d) que seja promovida uma rápida uniformização dos regulamentos internos dos vários estabelecimentos de modo a evitar disparidades injustificadas de critérios entre os mesmos, propiciadora de sentimentos de desigualdade e de injustiça.

O Provedor de Justiça determinou ainda nova visita de colaboradores seus ao EP de Caxias, na convicção de que um mais completo esclarecimento das novas regras regulamentares aos reclusos favorecerá a normalização da situação, no respeito pelos procedimentos próprios do Estado de Direito.

Nota: o texto integral do relatório da Provedoria de Justiça sobre este assunto, enviado ao Senhor Ministro da Justiça, pode ser consultado em http://www.provedor-jus.pt ou solicitado pelo telefone 21 3926632.



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