O Provedor de Justiça divulga direitos dos proprietários de solos cativados, nos termos do novo Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional

 
A missão que a Constituição e a lei confiam ao Provedor de Justiça compreende a divulgação do conteúdo e do sentido de cada um dos direitos e liberdades fundamentais. O direito de propriedade privada encontra acolhimento constitucional no artigo 62.º, entre os direitos económicos, sociais e culturais, beneficiando, por ter natureza análoga, da proteção específica dos direitos, liberdades e garantias (artigo 17.º da Constituição).
O acesso por todos à propriedade privada constitui-se, entre outros, como um dos alicerces essenciais da comunidade. E a salvaguarda contra restrições arbitrárias, principalmente quando impostas a patrimónios de pequenos e médios proprietários, apresenta-se como forma de evitar o agravamento das desigualdades e como fator de segurança que os Estados de direito honram junto dos cidadãos.
Por este conjunto de razões, o Provedor de Justiça dá a conhecer a todos aos cidadãos, em particular aos proprietários de solos cativados por estudos prévios de futuras mas incertas estradas nacionais, os direitos que o novo Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional (Lei n.º 34/2015, de 27 de abril) lhes atribui.
Dispõe o número 5 do artigo 32.º desse diploma que as restrições à edificação caducam decorridos cinco anos da publicação do estudo prévio de uma estrada nacional ou sua variante. No caso de se justificar a prorrogação daquele prazo, o proprietário deverá ser indemnizado.
Confirma-se, assim, a alteração que o Senhor Secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações se comprometera a incluir na proposta de lei e que o Governo veio a apresentar à Assembleia da República[1].
Há muito que o Provedor de Justiça vinha alertando o legislador para a absoluta desproteção de pequenos e médios proprietários, encaminhando muitos para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, após o esgotamento das vias jurisdicionais internas.
Até serem aprovados o anteprojeto e o projeto de execução da estrada – algo que, em alguns casos, demorou décadas –, o proprietário não recebia nenhuma indemnização, apesar de estar impedido de construir no seu terreno e não dispor sequer da garantia de vir um dia a ser expropriado por utilidade pública. Bastava, para tal, que a estrada não fosse construída ou que viesse a apresentar-se com um traçado diferente, designadamente por razões de impacto ambiental negativo.
Sobretudo nos últimos anos, foram muitos os estudos prévios de estradas nacionais ou de variantes que, embora contemplados no Plano Rodoviário Nacional, não conheceram evolução por força das contingências orçamentais.
Conquanto a Recomendação n.º 4/B/2008, de 15 de abril[2], tivesse, ao tempo, obtido um acolhimento favorável da parte da Assembleia da República, certo é que a iniciativa de rever o Estatuto das Estradas Nacionais, aprovado pela Lei n.º 2037, de 19 de agosto de 1949 e o Decreto-lei n.º 13/94, de 15 de janeiro, só agora se efetivou. Em consequência, os proprietários de terrenos que se encontravam na situação descrita estavam mais desprotegidos do que aqueles que são expropriados por utilidade pública, uma vez que estes têm direito a uma justa indemnização, nos termos constitucionais (número 2 do artigo 62.º da Constituição). Estavam também em uma situação mais gravosa do que a dos lesados por expropriação pelo sacrifício, imposta por plano de ordenamento do território, uma vez que estes são compensados por mecanismos de perequação.
Assinale-se, por fim que a nova lei não permite aos lesados aproveitar o tempo anterior à sua entrada em vigor para o cômputo dos cinco anos sob servidão administrativa non aedificandi. O número 6 do artigo 32.º é perentório a este propósito: «No caso dos estudos prévios aprovados antes da data da entrada em vigor do presente Estatuto, a contagem do prazo referido no número anterior tem início à data da publicação deste».


[1] Cf. Nota publicada neste sítio em 23 de dezembro de 2014 (www.provedor-jus.pt/?idc=35&idi=15487)
[2] www.provedor-jus.pt/?idc=67&idi=1120