O Provedor em Portugal

Remontam à década de 70 do século XX os primeiros contributos para criação do Provedor de Justiça no nosso país. José Magalhães Godinho, Vasco da Gama Fernandes e Mário Raposo foram as pessoas que primeiramente defenderam a criação, em Portugal, de uma instituição que, à semelhança do que sucedia no Norte da Europa, prevenisse e promovesse a defesa constante e vígil dos direitos dos cidadãos contra as incorreções e excessos dos poderes públicos.

Foi, porém, após a revolução de abril de 1974 que se caminhou verdadeiramente para a instituição de tal entidade, caminho que se iniciou com o relatório geral sobre os trabalhos produzidos pelas várias comissões de reforma judiciária estabelecidas pelo Decreto-Lei n.º 261/74, de 18 de junho. No referido relatório propunha-se que, na ordem jurídica portuguesa, fosse criado o Provedor de Justiça, o qual deveria ser designado pelo poder legislativo, sob proposta do Ministro da Justiça, inteiramente independente do poder executivo, tendo como função receber queixas específicas, emanadas dos particulares, visando uma injustiça ou um ato de corrupção ou de má administração. Como correlato desta atribuição, o Provedor de Justiça teria os poderes – não decisórios – de averiguação, de crítica e de publicitação da atuação administrativa, sem, não obstante, a poder modificar, o que justificaria, por conseguinte, a manutenção de mecanismos de controlo jurisdicional dos atos administrativos. A boa aceitação do Ombudsman no estrangeiro sugeria a sua boa receção no nosso país.

Salgado Zenha, então Ministro da Justiça, foi o impulsionador do cargo de Ombudsman em Portugal, através do seu «Plano de Ação», o qual foi aprovado em Conselho de Ministros de 20 de setembro de 1974. Fruto de um estudo realizado pela Procuradoria-Geral da República, devidamente mandatada para o efeito, foi elaborado um anteprojeto de diploma legal, anterior ao Decreto-Lei n.º 212/75, de 21 de abril, que criou o cargo de Provedor de Justiça que visa «fundamentalmente assegurar a justiça e a legalidade da Administração Pública através de meios informais, investigando as queixas dos cidadãos contra a mesma Administração e procurando para elas as soluções adequadas» (n.º 1 do artigo 1.º).

Os trabalhos preparatórios da Constituição de 1976 não ignoraram a recente instituição do Provedor de Justiça, tendo-a prevista nos projetos de Constituição apresentados por três dos partidos representados na Assembleia Constituinte: o Centro Democrático Social, o Partido Socialista e o Partido Popular Democrático. Após a sua discussão e aprovação a 2 de abril de 1976, a Constituição da República Portuguesa consagrava, no seu artigo 24.º o órgão do Estado Provedor de Justiça, cujo teor aqui se reproduz:

«Artigo 24.°

(Provedor de Justiça)

1 – Os cidadãos podem apresentar queixas por ações ou omissões dos Poderes Públicos ao Provedor de Justiça, que as apreciará sem poder decisório, dirigindo aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir e reparar injustiças.

2 – A atividade do Provedor de Justiça é independente dos meios graciosos e contenciosos previstos na Constituição e nas leis.

3 – O Provedor de Justiça é designado pela Assembleia da República.»

Contudo, em momento anterior à aprovação da Constituição e ao abrigo do Decreto-Lei n° 212/75, tinha já sido nomeado, por despacho da Presidência da República publicado no Diário do Governo, 2.ª série, de 31 de dezembro de 1975, o primeiro Provedor de Justiça, o Tenente-Coronel Manuel da Costa Brás. Pretendendo documentar-se sobre o modo de funcionamento das instituições análogas existentes na Dinamarca e em França, o Provedor de Justiça designado iniciou, no dia 18 de Janeiro de 1976, uma visita àqueles países, junto de quem colheu elementos sobre o modo de resolver os problemas inerentes à instalação em Portugal do Serviço do Provedor de Justiça, criado pelo Decreto-Lei n.º 189-A/76, de 15 de março, com o propósito de prestar o apoio técnico e instrumental necessário à prossecução das atribuições daquele. Em 17 de março de 1976, o Tenente-Coronel Manuel da Costa Brás tomou posse como Provedor de Justiça, órgão de Estado que representou até à sua nomeação como Ministro da Administração Interna, ocorrida em 23 de julho de 1976. Seguiu-se-lhe no cargo José Maria Barbosa de Magalhães Godinho, que tomou posse em 12 de novembro de 1976.

Desde a sua instituição, no ano de 1975, até à presente data foram dez os Provedores de Justiça em Portugal, sendo a atual titular do cargo, Maria Lúcia Amaral, a primeira mulher.

Instalações

Aquando a tomada de posse do primeiro Provedor de Justiça, em março de 1976, o serviço que tinha como função prestar-lhe o apoio técnico e instrumental necessário à prossecução das suas atribuições foi instalado num imóvel arrendado localizado no n.º 38 da avenida 5 de outubro, em Lisboa. A centralidade da sua localização, que permitia o fácil acesso por parte dos cidadãos, não era, porém, acompanhada da oferta de condições de trabalho.

Na década de 90 do século passado, foram comunicados à Assembleia da República os problemas da falta de espaço das referidas instalações. Hoje, os serviços de apoio ao Provedor de Justiça estão instalados num edifício situado na rua do Pau de Bandeira, n.ºs 7 e 9, na Lapa. A arquitetura do edifício residencial, que ao longo dos tempos serviu, entre outros, as embaixadas da Alemanha, dos Estados Unidos e a Empresa Geral de Fomento, foi adaptada e ampliada, sendo atualmente local de trabalho de todos aqueles que colaboram com o Provedor de Justiça e do próprio titular deste órgão de Estado.

No âmbito da comemoração do 40.º aniversário do Provedor de Justiça em Portugal foi realizado, pela Escola Superior de Comunicação Social, um pequeno filme sobre a génese e missão deste órgão do Estado. Para o visionar, clique abaixo.