Procedimentos seguidos por junta de freguesia na emissão de atestados de residência para imigrantes deverão ser alterados, segundo recomendação do Provedor de Justiça

Os procedimentos seguidos por uma junta de freguesia para a emissão de atestado de residência a favor de imigrantes deverão ser alterados para que seja observado o regime legal em vigor nesta matéria. A Recomendação do Provedor de Justiça surge na sequência da reclamação de um cidadão estrangeiro quanto aos documentos pedidos pelos serviços da junta de freguesia em causa para a emissão de atestados de residência. De acordo com os dados disponibilizados pela autarquia local, para a passagem de atestados de residência a favor de cidadãos estrangeiros é usualmente solicitada fotocópia do passaporte na titularidade daqueles, assim como o preenchimento de um requerimento. Este requerimento só é validado mediante apresentação do contrato de compra e venda de imóvel destinado a habitação própria, ou declaração subscrita por senhorio (eventualmente acompanhada por recibos relacionados com o consumo de água e de electricidade no local da residência), assim como declaração emitida pela entidade patronal do cidadão requerente.

Ora, de acordo com a definição do quadro de competências das autarquias locais, assim como do regime jurídico de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias, compete à junta de freguesia “passar atestados nos termos da lei”. O artigo 34.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de Abril, na redacção a este dada pelo Decreto-Lei n.º 29/2000, de 13 de Março, que veio a estabelecer os princípios gerais de acção a que devem obedecer os serviços e organismos da Administração Pública na sua actuação face ao cidadão, determina que “os atestados de residência, vida e situação económica dos cidadãos (…) devem ser emitidos desde que qualquer dos membros do respectivo executivo ou da assembleia de freguesia tenha conhecimento directo dos factos a atestar, ou quando a sua prova seja feita por testemunho oral ou escrito de dois cidadãos eleitores recenseados na freguesia ou, ainda, mediante declaração do próprio”. Prescreve o mesmo preceito que “as falsas declarações” prestadas nesta matéria “são punidas nos termos da lei penal”, o que pretende salvaguardar a legalidade dos procedimentos a adoptar pelas juntas de freguesia, determinando que as falsas declarações fazem incorrer o seu autor em responsabilidade criminal.

A análise do quadro legal vigente permite concluir que, sendo as juntas de freguesia competentes para a emissão de atestados de residência, não se afigura legítima a recusa do exercício daquela competência, com base na não apresentação de alguns dos elementos documentais actualmente exigidos, pelos serviços da junta de freguesia em causa. A legislação em vigor exige apenas, como condição para a emissão de atestados, a verificação de uma das seguintes circunstâncias: O conhecimento directo dos factos a atestar, por parte de algum dos membros do executivo ou da assembleia de freguesia, o testemunho oral ou escrito de dois cidadãos eleitores recenseados na freguesia, ou a declaração do requerente.

O Provedor de Justiça sublinha que o carácter taxativo e cumulativo dos documentos solicitados pela junta de freguesia encontra barreiras decorrentes da realidade não raras vezes protagonizada pela população imigrante residente em Portugal. No mercado laboral e habitacional das comunidades estrangeiras radicadas em território nacional prolifera, de forma censurável, a actividade económica paralela. Assim sendo, será de supor que, nos casos de arrendamento urbano não declarado, ou de actividade profissional irregular, os requerentes se debatam com dificuldades acrescidas, decorrentes da não colaboração dos senhorios, ou das entidades patronais, na subscrição das declarações exigidas pela junta de freguesia. Tal facto, associado à importância de que se reveste, no processo de regularização da permanência de cidadãos estrangeiros no país, a apresentação de atestado de residência, determinará a potencial viciação dos circuitos vivenciais dos requerentes, uma vez que, ao não verem emitido, a seu favor, o atestado de residência solicitado, não dispõem de forma válida de quebrar a lógica de clandestinidade a que se encontram votados. Pelos argumentos aduzidos, importa rever a prática seguida pela junta de freguesia em causa, que, para Nascimento Rodrigues, pode mesmo indiciar foros discriminatórios passíveis de censura face ao princípio constitucional da igualdade.

Nota: O texto integral da Recomendação está disponível no sítio da Provedoria de Justiça, através da seguinte ligação:http://www.provedor-jus.pt/restrito/rec_ficheiros/Rec9A07.pdf

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